quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

Jogos Críticos

Na sua essência, os jogos visam entreter o usuário. Hoje, isso não é problema com o vasto acervo de games disponíveis. Embora quantidade não seja sinônimo de qualidade, é fácil afirmar que existem várias pérolas na indústria do video game dignas de várias horas de jogo.

Acontece que muitos desses jogos simplesmente oferecerem seqüências de matança desenfreada ou o ato de martelar um botão no controle sem pensar muito. Outros oferecem horas a fio de quebra-cabeças de te fazer suar de tanto pensar. Tudo isso é divertido: afinal, se não fosse, não haveria público e não faria sucesso. No entanto, a maioria visa apenas o entretimento do jogador.

O destaque se dá, contudo, quando jogos começam a desviar dos gêneros clássicos para oferecer uma mensagem em forma de jogo. Não significa que o jogo, como estrutura jogável, seja excelente, mas se nota que além do entretenimento, jogos também podem ter outra função. Surgem então as várias ramificações dos jogos não voltados simplesmente para passar o tempo dos usuários.

Existem jogos educativos, simuladores, publicitários e por ai vai. Cada um utilizando a estrutura de regras de um jogo para comunicar uma mensagem diferente. Em meio a essa gama de opções é que surgem também os jogos críticos. Seja em referência à sociedade, à política ou qualquer outra temática. Os jogos eletrônicos, hoje, já fazem parte de uma cultura global e certos desenvolvedores buscam se aproveitar dessa estrutura para transmitir informação.

Uma desenvolvedora italiana, Molleindustria, cria jogos que servem de perfeito exemplo para esse novo gênero. Jogos feitos por eles incluem um de estratégia no qual você deve gerenciar o McDonald's (desde a criação de gado, até a venda dos hamburgers), outro no qual você deve cuidar de um proletário "tamagochi", um terceiro em que você deve proteger padres pedófilos e assim em diante. Torna-se evidente que o conteúdo certamente não é recomendado (tecnicamente) para os menores de 18 anos e na prática para quem não tem maturidade suficiente para entender.

O objetivo da desenvolvedora, como especificado no site, é apropriar os jogos como um método de comunicação em massa. Se autodenominando como criadora de jogos radicais contra a ditadura do entretenimento e buscando evitar os clichês, Molleindustria coloca seus jogadores para pensar. Seja controlando o presidente Bush para roubar pensamento crítico da sociedade, evitando que o seu operário entre em greve, lançando estratégias de marketing atrativas para o terceiro mundo com a ajuda do Ronald McDonald, fingindo ter um orgasmo ou usando o "papa-cóptero" para resgatar um padre em apuros. Apesar de muitas vezes lidar com temas delicados, o conteúdo crítico passado claramente questiona situações atuais. Cada jogo contém um introdução que fundamenta a sua criação e inicia a reflexão.

Apesar do site afirmar que você pode jogar sem pensar, eu discordo. Os jogos, apesar de divertidos por alguns minutos, não visam o entretenimento puro. Por isso, o jogo serve como exemplo de inovação quanto à criatividade porque a estrutura é toda usada como um estopim para a discussão e a conscientização em massa. Tente gerenciar o McDonald's por alguns minutos e veja como não é fácil lucrar se sempre formos politicamente corretos. Use essa experiência de jogo para pensar e questionar a situação atual. Mais tarde, perceba como isso tudo começou a partir de um jogo independente.

Jogos Recomendados:

Operation: Pedopriest

McDonald's Video Game

Orgasm Simulator

Enduring Indymedia

Tuboflex

TamaTipico

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

Entrevista com Bruno Cavalcanti

Agora que você, leitor, já tem uma decente fundamentação no mundo dos jogos independentes, iremos nos aprofundar. O tema será sempre sobre jogos independentes ou a conexão de um assunto com os mesmos. O Brasil certamente não é o país que lidera nesse quesito, mas fazemos parte dele. Um ótimo representante deles, nada incomum à cena, é Bruno Cavalcanti. Membro da Gamecultura, que já foi entrevistado e escreveu para o portal. O seu destaque se dá pela Beware The LadyBettle (BTL) e sua obra The Spoiler.

Se você não sabe o que é The Spoiler, aqui vai uma descrição breve.

The Spoiler é um jogo grátis de aventura point and click (apontar e clicar) que mistura investigação e ação em um tribunal. Você é o advogado Gaspar Biz que tem como missão defender seu cliente, Carlson Bekker, único suspeito do crime de Arielle Rumble, sua ex-namorada. No jogo, seu trabalho não será nada fácil. Durante os três dias de investigação, as coisas se tornam cada vez mais complicadas. No tribunal, o veredito não depende apenas do resultado da investigação. A forma que você conduz o seu caso tem grande peso na decisão dos jurados.

Para os mais pacientes, há também uma resenha (sem spoilers) disponível no GameCultura que eu mesmo escrevi. Por fim, não há melhor jeito de conhecer o jogo que jogando. Baixe The Spoiler no site do BTL. É de graça, não vai doer.

Entrevista

Arthur Protasio: Bruno, antes de qualquer coisa, queria agradecer pela oportunidade. Agora, sem mais delongas, vamos às perguntas. Nacionalidade, Idade e formação? O que faz atualmente?

Bruno Cavalcanti: Brasileiro, 28 anos, empresário. No momento, estou tentando finalizar nosso segundo jogo: Brass Tracks.

Arthur: Desde quando você se interessa por jogos?

Bruno: Desde o Atari. Foi minha primeira experiência com jogos eletrônicos e última com video games. Nunca soube lidar com joysticks e o clássico controle do Atari, um manche e um botão vermelho, já era demais pra mim... Larguei o Atari por um MSX. Em seguida, foi MSX 1 Plus, MSX 2, Amiga e, finalmente, PCs.

Arthur: Que jogos te marcaram mais?

Bruno: Abadia Del Crímen da espanhola Dynamic para o MSX, é como o Velvet Underground do mundo dos games. Pouco conhecido e injustiçado, embora tenha sido um dos jogos mais inovadores de todos os tempos, creio eu. O jogo era baseado no romance O nome da rosa, de Umberto Ecco, que disse ter gostado mais da adaptação feita para o jogo do que para o cinema; que moral, né? Pois pra mim, é melhor que o filme e que o livro!... O jogo era em terceira pessoa, em perspectiva 3D e usava duas cores apenas. Foi minha primeira experiência com um jogo que tinha um roteiro propriamente dito, havia um motivo para continuar jogando, um mistério a ser desvendado dentro de um mosteiro gigantesco cheio de esconderijos e salas secretas! Era diferente de tudo que havia visto. Por exemplo, Space Invaders, PacMan ou Enduro, que começavam do nada e terminavam em lugar nenhum. Houve outros, mas nenhum chegou nem perto do impacto deste...

Arthur: Que critérios você utiliza para considerar um jogo bom ou não?

Bruno: Um jogo bom: uma história bacana, pertinente e bem elaborada. Um jogo ruim: qualquer jogo que tenha aquela maldita barra de energia no topo, ou então aqueles jogos de plataforma super movimentados, cheios de fases e inimigos. Eu fico desesperado! Até hoje tenho pesadelos com o Sonic...

Arthur: Que momento é mais frustrante durante um jogo?

Bruno: Quando o jogo trava e você não sabe se salvou. Principalmente quando trava e o computador não reseta, fica aquela tela congelada, estaticamente perversa, e você começa a rezar com esperança que o jogo volte a funcionar. Mas não tem jeito: você precisa reiniciar o Windows e começar o jogo de novo...

Arthur: O que te motivou e inspirou a seguir essa "carreira"?

Bruno: É aquela coisa: que fã de cinema nunca sonhou em fazer seu próprio filme? Colecionador de discos, em formar sua própria banda? Desde minhas primeiras experiências com jogos, de alguma maneira pensava em um dia fazer os meus... Mas fui perdendo o interesse em testar novos jogos porque cada vez me decepcionava mais com as novidades: jogos cada vez mais bem produzidos, detalhados e repetitivos... De certa forma, a maioria dos jogos famosos é voltada ao público adolescente, e por isso, politicamente corretos. Por isso, creio que minha maior inspiração foi o desafio de criar um jogo que fosse realmente gostar.

Arthur: Que critérios (você) utiliza para dar início à criação de um jogo?

Bruno: Não sei dizer... Talvez algo que seja diferente, com história de qualidade, mas esse tipo de julgamento é bastante pessoal. Creio que a melhor resposta seria "um jogo que fosse me interessar, me prender em frente ao computador até amanhecer".

Arthur: Quais as motivações para criar especificamente o The Spoiler?

Bruno: Foi meu primeiro jogo, portanto, foi o motivo que me fez seguir essa carreira. Além disso, um jogo que se passasse dentro de um tribunal, como um filme, pareceu ser relativamente fácil de fazer e o fato de não existir um jogo desse tipo (pelo menos que eu saiba) foi a gota d'água...

Arthur: Quanto tempo demorou para desenvolver o jogo? Quantas pessoas participaram?

Bruno: Cerca de um ano. Efetivamente, participaram três pessoas. Como nunca tínhamos feito nada parecido, foi um sufoco ter de refazer algumas partes várias vezes: é frustrante se dar conta que certo acontecimento no final do jogo é incoerente com alguma coisa no início, e acabar tendo de mexer em tudo. Mas o pior de tudo é saber que se tivesse o conhecimento que tenho hoje, teria completado The Spoiler sozinho, à minha maneira, em menos tempo e sem esquentar a cabeça... Quem sabe um dia eu lance: "The Spoiler: Director's Cut"?

Arthur: Quais são seus planos futuros?

Bruno: Terminar nosso segundo jogo, Brass Tacks, e torcer para que não siga o mesmo rumo de anonimato e descaso do primeiro. Acho difícil de isso acontecer, porque dei atenção às críticas e busquei evitá-las. Além disso, o jogo será em inglês, o que muda tudo... Mas se mesmo assim atolar, acho difícil continuar nessa. É muito tempo dedicado, esforço e empenho para pouco apoio e quase nenhum reconhecimento. E estamos falando de jogos gratuitos...

Arthur: O que mudaria na indústria de jogos brasileira?

Bruno: Olha, não saberia por onde começar. Mas o mais importante, acho que seria a mentalidade das pessoas. Valorizar o que é produzido no país, apoiar iniciativas independentes... Mas sou pessimista quanto a isso, já me envolvi com outras coisas, como gravadora de bandas independentes, produção de shows, já fiz até fanzines (risos)... No fim das contas, a mentalidade é a mesma.

Arthur: O que você considera vantagem e desvantagem para um desenvolvedor independente? Dentro e fora do Brasil?

Bruno: Como vantagem, a liberdade criativa de poder fazer do seu jogo algo que considere arte e de que se orgulhe. Desvantagem, com certeza o retorno financeiro, marketing, divulgação etc.

Arthur: Quais as suas sugestões para um desenvolvedor independente no Brasil?

Bruno: Se baseando em minha experiência, faça-o em inglês. Além de torná-lo viável mundialmente, acho que chamaria mais a atenção dos gamers brasileiros.

Arthur: Para seguir uma carreira na indústria dos jogos, você acha que a melhor coisa que um desenvolvedor pode fazer é buscar sair do país? Ou ainda há esperança aqui no Brasil?

Bruno: A melhor escolha seria continuar no Brasil, mantendo o foco no mercado estrangeiro. Como disse, tenho certa experiência em diversos formatos e categoria de "projetos empresariais" (micro empresas sempre: começar de baixo e sonhar a médio/longo prazo). Nosso governo é notório por manter constante e inabalável o princípio do "quanto menos, melhor" no que se refere à atenção destinada às áreas essenciais de desenvolvimento sócio-econômico. Micro e pequenas empresas não deixam nada a desejar no que se refere ao descaso à educação, saúde e saneamento básico.

Lembro que durante o desenvolvimento de The Spoiler, descobri que tinha sido realizado um concurso promovido pelo Ministério da Cultura (ou órgão parecido) para desenvolvedores de jogos independentes. A lista de campeões resumia perfeitamente o que quero dizer: dos dez jogos vencedores, havia uns sete ou oito sobre saci-perere, bicho-papão, mula sem cabeça e toda a sorte de folclore brasileiro... Quisera eu saber disso em tempo de me inscrever: imagine um jogo picareta onde o curupira e boi-bumbá se unem contra o desmatamento da Amazônia? Sobrevivência do mico-leão-dourado? Do boto cor-de-rosa? Se passar de fase, ganha uma tele-sena, se perder uma vida, um abacaxi do chacrinha... E terminam o jogo como sindicalistas da CUT, com direito a greve e tudo mais? Enfim, cada um na sua; mas minha perspectiva, com certeza, é longe disso...

Arthur: Últimas palavras?

Bruno: Para quem produz jogos e distribui gratuitamente, não há reconhecimento maior do que receber comentário de pessoas que jogaram. Elogios ou críticas, não importa o tipo de comentário: sempre é importante, sempre é considerado e usado para criar jogos cada vez melhores!...

Se você quer fazer parte da equipe, basta disposição! Nós temos planos a médio-prazo de fazer da equipe uma pequena empresa comercial, onde pessoas apaixonadas por jogos possam ser remuneradas realizando seu sonho. Entre em contato no nosso site: www.beware.co.nr.

Por fim, aos que ainda não botaram a mão na massa, apenas sonham em um dia fazer seu próprio jogo, vai o recado: não perca tempo! Comece já! Tem uma frase bem legal, que nunca esqueço: "Por não saber que era impossível, foi lá e fez!" Não se preocupe com quaisquer obstáculos (programação, interface, estilo etc), esboce personagens, roteiro, concepção; faça o que puder e admire seu trabalho: é dele que, gradualmente, vem a motivação necessária para ir cada vez mais além...

"A diferença entre o vencedor e o perdedor é que o segundo desistiu no meio do caminho". Boa sorte, e estamos aí para ajudá-los no que pudermos!

Divirta-se, acompanhe, participe no fórum e acima de tudo: uma excelente jogatina!

Jogo Recomendado:

The Spoiler

domingo, 14 de outubro de 2007

Jogos Independentes e seus Afluentes: Jogos Completos

No mês passado, vimos o que são as modificações (MOD). Entendemos como elas se originam e porque proliferam tanto no mundo dos games. Ocorre que o meio dos jogos independentes não pertence somente às modificações. Existem jogos que não precisam de outro software para rodar. Na falta de uma denominação melhor, esses são os jogos completos: são tão essenciais para o meio independente como os MODs, e também possuem seus atrativos únicos.


Ao contrário das modificações, os jogos completos têm uma estrutura geralmente mais elaborada. No entanto, eles podem ter uma única fase, assim como um MOD. O jogo completo, contudo, não precisa de nenhum outro software para ser executado, ou seja, ele é o que muitos chamam de stand-alone. O termo se traduz ao pé da letra como "que fica de pé sozinho" e na prática significa auto-executável - um jogo que não precisa de nenhum programa adicional para rodar. Um claro exemplo disso são os jogos que fazem uso de engines conhecidas, mas na realidade são produtos independentes. The Ship, além de servir como exemplo de um jogo original e criativo, era inicialmente um mod de Half-Life.

Hoje em dia pode ser adquirido como um produto totalmente independente, apesar de fazer uso do Source Engine (do Half-Life 2). O mesmo vale para o recorrente Counter-Strike (CS). Os CSs mais antigos precisam ainda do Half-Life para serem executados, já o Counter-Strike Source funciona independentemente da instalação do Half-Life 2 na máquina. Isso ilustra que tanto CS: Source como The Ship são jogos stand-alone e consequentemente jogos completos.

Se a diferença entre stand-alone e modificação implicasse simplesmente na necessidade de ter um ou mais programas para rodar um jogo, não seria relevante para essa coluna. Contudo, esta diferença é de grande importância. Ela acarreta uma maior liberdade (e geralmente mais trabalho) ao processo de criação, porque necessariamente se começa do zero e não se aproveita conteúdo nenhum de outra fonte. Isto gera uma originalidade inevitável, pois por mais que uma engine seja aproveitada as possibilidades são totalmente diferentes. Por exemplo, os jogos Gears of War, Rainbow Six: Vegas e Bioshock usam o Unreal Engine. Todos os três jogos envolvem tiros, com temáticas diferentes, seja em termos de programação, modelagem, animação, "texturização", jogabilidade ou roteiro.

Essa criação de conteúdo original abre espaço para a criatividade e a elaboração de uma nova estrutura de jogo. Novos recursos são implementados e novas formas de exercer a jogabilidade também. Portanto, o que antes poderia ser visto como um fardo se transforma em vantagem inovadora. Não mais precisa um desenvolvedor ficar restrito à estrutura de um FPS, RTS, Side-Scroller e assim em diante.

Naturalmente, isso resulta em uma faca de dois gumes, como antes explicitado. Ao passo que as possibilidades de criação são ilimitadas, os recursos não. É necessário ter conhecimento de programação (dentre outros) e afinco para atingir resultados. A limitação de recursos é maior ainda no meio "indie", pois ironicamente as desenvolvedoras e distribuidoras (do meio comercial) que têm recursos não costumam arriscar com medo de terem prejuízo. Logo, aqueles que têm mais dificuldades são justamente os que visam o desenvolvimento de produtos inovadores. Existem exceções, mas tudo que depende de dinheiro para se sustentar não pode ultrapassar o limite do lucro para o prejuízo, afinal isso resulta em falência.

A motivação para fazer um jogo independente completo geralmente é a mesma de um MOD. Isso ocorre porque ambos os produtos são similares e quem os desenvolve são pessoas que buscam ousar através da inovação. Seja por diversão, engrandecimento de carreira e currículo ou atenção. Há casos de desenvolvedoras "alternativas", mas essa é a exceção e não a regra.

Para promover as obras e seus criadores é que existe a Independent Games Festival (IGF). Ela acontece geralmente junto (física e temporalmente) com a Game Developers Conference, que por sua vez é a famosa GDC. Na IGF, há prêmios em diversas categorias para vários jogos e muitas idéias inovadoras recebem a atenção devida no evento.

A título de exemplo e categorização, é importante identificar que a IGF possui certas competições. Duas delas merecem destaque nesta matéria, pois são a competição principal (Main Competition) e a competição dos MODs (Mod Competition). A organização do festival é feita de forma que as diferenças entre modificações e stand-alones sejam reconhecidas. Inclusive o valor dos prêmios é maior na competição principal, podendo chegar a US$20 mil (vinte mil dólares).

Por fim, chega a melhor parte: a recomendação de jogos que ilustram todas essas palavras aqui escritas.

O primeiro deles lida de maneira criativa com a estrutura do side-scroller. And Yet It Moves é um jogo 2D que lida com quebra-cabeças que exigem que você gire o cenário em sentido horário ou anti-horário para poder avançar na fase. No entanto, tenha cuidado, porque a gravidade se adequada ao sentido do cenário e aquela pedra que antes estava debaixo dos seus pés, agora pode estar prestes a esmagar sua cabeça.

Racing Pitch é o segundo deles. Em teoria um jogo de corrida, mas na realidade uma forma de colocar em prática aquela mania de criança de imitar carros com a voz. É exatamente assim que você dirige em Racing Pitch. Por esse motivo o microfone é um pré-requisito na hora de jogar, mas o mais importante é reconhecer como a estrutura de um jogo de corrida foi inovada através do uso do som.

Em terceiro lugar, Gamma Bros. é um jogo que traz uma nova visão aos jogos de espaço, como Space Invaders. Pense nesse jogo como o "Mario Bros. do espaço", mas em vez de esperar inimigos vindo a partir de uma única direção na tela (geralmente a direita), eles virão de todas. Os seus itens flutuantes, como vida e "power-ups" estão disponíveis, mas é um jogo que busca a inovação na estrutura dos jogos de ação com naves em 2D.

Por último, Toblo. Jogo desenvolvido pelos estudantes da escola de jogos DigiPen no qual a estrutura inovada é a multi-player "capture the flag". Uma clássica disputa entre times por determinados blocos do time oposto. Em essência, o jogo lida com a nova possibilidade de usar esses cubos para nocautear membros do time oposto ao passo que os blocos premiados estão localizados em estruturas gigantescas, também feita destas formas geométricas.

Finalmente chegamos ao fim de nossa introdução e agora você leitor já sabe o básico sobre jogos independentes. Contudo, isso não significa o fim dessa coluna, pelo contrário, todo mês espere novas discussões acerca dos jogos independentes.

Divirta-se, acompanhe, participe no fórum e acima de tudo: uma excelente jogatina!

  • Jogos Recomendados:

o And Yet It Moves

o Racing Pitch

o Gamma Bros.

o Toblo

quinta-feira, 30 de agosto de 2007

Jogos Independentes e seus Afluentes: Modificações

No mês passado, vimos o que são os jogos independentes. Entendemos que eles geralmente se dividem em modificações e jogos completos. Reconhecemos também que apesar de existirem semelhanças é possível traçar uma distinção entre ambos. Partindo da premissa de que muitos criadores de jogos iniciaram seus estudos a partir da modificação de outros, hoje abordaremos as modificações.

Embora não seja regra, geralmente fazer uma modificação, vulgo MOD, de um jogo é mais fácil que um jogo completo. Isso se dá porque a modificação parte de algum ponto em comum com um jogo previamente feito. Geralmente esse ponto comum é a base, ou seja, o código-fonte da programação. Significa que quem está criando a modificação não precisa se preocupar com mais um aspecto da criação de um jogo e nesse caso, um relativo à programação. Por esse mesmo motivo vários jogos aproveitam a game engine de outros jogos, mas ainda assim são considerados jogos completos. Logo a mesma engine não é o suficiente para caracterizar uma modificação.

Vide por exemplo Dark Messiah of Might and Magic (Arkane Studios). Um jogo em primeira pessoa que utiliza a mesma engine do Half-Life 2: o Source Engine. No entanto, apesar das semelhanças, o restante do conteúdo é original e entende-se que há material suficiente para criar uma distinção entre ambos, seja através de mapas, horas de jogo, ambientação, música ou texturas. A câmera de ambos os jogos é em primeira pessoa, no entanto o Dark Messiah faz uso de armas brancas, magia e combate corpo a corpo em meio a uma temática de fantasia medieval, enquanto o Half-Life 2 se foca em armas de fogo e uma ação repleta de tiroteios em uma temática de ficção científica.

A situação inversa ocorre com as modificações chamadas de “conversões totais”. Uma conversão total que, ao aproveitar a engine do jogo, se propõe a mudar a maioria dos elementos de um jogo. Uma espécie de conversão, como o nome já diz, mas que não é suficiente para ser um jogo totalmente novo. Esse é o caso de modificações que em vez de alterarem aspectos isolados de um jogo, como a velocidade de projéteis ou a aparência de um personagem, buscam alterar características de todas as armas e as aparências de todos os personagens, por exemplo. Nessa situação a engine é uma das poucas coisas em comum, além da jogabilidade, que deixará o jogador determinar se o que ele está jogando é uma modificação ou um jogo completo.

Levando em conta a vasta quantidade de modificações existentes em todo o mundo e para os mais vários jogos, uma definição mundialmente aceita de mod poderia ser: Um jogo customizado ou alterado, que pode variar em proporção parcial ou total, a fim de criar uma nova jogabilidade em torno de um jogo que servirá como fonte de inspiração ou recursos técnicos. As alterações podem variar em qualquer âmbito e quanto mais houver delas, mais próximo o Mod estará de uma conversão total.

Quanto mais se busca entender a distinção entre jogo completo e modificação é que duas coisas se revelam. Primeiro, que essa distinção não pode ser facilmente feita e segundo, que importa principalmente a sensação do jogador. Um jogador notará se a sua experiência parece estar enraizada em outro jogo. Isso se torna evidente quando uma modificação necessita do jogo completo para ser executada e especialmente quando inúmeros recursos (texturas, modelos, mapas, scripts etc) são aproveitados. No entanto, caso o jogador identifique que vários recursos são de fato originais e toda a experiência jogável se destaca de uma possível fonte, deve-se concluir que provavelmente se está lidando com um jogo completo.

Ainda assim, não é fácil traçar uma linha divisória. Como dito, torna-se necessário o discernimento de um jogador para poder opinar quanto à sensação criada pela jogabilidade. Um caso polêmico ocorre quando comparamos Eclipse com 7th Serpent. Eclipse se considera, como o próprio site diz, uma conversão total do jogo Half-Life 2 enquanto 7th Serpent se considera uma conversão total do jogo Max Payne 2. De fato, todos os dois jogos criam experiências jogáveis únicas e digo isso por experiência própria.

No entanto, cada um se destaca de uma maneira diferente e para poder identificá-los como modificações é necessário conhecer a sua fonte. Half-Life 2 pode ser resumido, como anteriormente feito, em um jogo de tiro em primeira pessoa ambientado em um universo da ficção científica. Max Payne 2 é um jogo de tiro em terceira pessoa que conta o recurso do conhecido bullet time e é ambientado em um universo típico de histórias policias “noir”. Eclipse e 7th Serpent são, respectivamente, um jogo de magia (especificamente telecinese) de terceira pessoa ambientado em um universo de fantasia medieval e um jogo de tiro de terceira pessoa ambientado em uma cidade moderna que vive uma guerra contra um agente especial. Apesar da descrição resumida de 7th Serpent soar muito parecia com o seu original, a diferença principal se dá na jogabilidade. A experiência jogável se torna quase cinematográfica através do combate contra inimigos nunca vistos antes, como tanques e helicópteros, todos em um ambiente que conforme o avanço do jogador vai sendo destruído e lembrando um filme hollywoodiano em que há mais destruição e explosões que qualquer outra coisa.

Eclipse desfruta de uma jogabilidade nova na qual o jogador controla uma garota que mata inimigos as fazer objetos como pedras e pedaços de madeira levitarem para depois arremessá-los. É possível afirmar por um lado que esse efeito é similar com o da arma gravitacional de Half-Life 2. 7th Serpent faz uso de um novo bullet time assim como de ambientes destrutíveis que são diferentes, mas ao mesmo tempo remetem a momentos do Max Payne 2.

Embora cada jogo se destaque genuinamente, nenhum deles realmente tem tempo de jogo suficiente (ou o polimento) para ser um jogo comercializado em lojas pelo mundo a fora. Isso não faz diferença, afinal são jogos independentes, mas o fato de se precisar do jogo comercializado (Max Payne 2 ou Half-Life 2) para jogá-los, nos indica na direção da modificação. É possível identificar possíveis raízes na jogabilidade, mas o melhor é poder reconhecer o conteúdo original e extremamente divertido.

A dúvida quanto à linha divisória entre jogos completos e modificações não pode ser empecilho para a imersão. Ambos esses jogos (e eu arrisco a considerá-los modificações) servem como exemplo para os jogos independentes com a sua originalidade e diversão. A resposta para dúvida virá com o discernimento do jogador enquanto testa o jogo. O principal é entender o valor da modificação. Que ela é uma ramificação do jogo comercializado e abre uma gama de possibilidades para os jogos independentes. Um dos afluentes que compõe o ramo dos jogos independentes e busca sempre melhorar a experiência de um jogo já existente.

Afinal, são jogos modificados que buscam apenas melhorar um jogo. Existe forma mais prática que torná-los mais divertidos? Os serious games que me desculpem, mas não.

· Jogos Recomendados:

o Conversões Parciais:

§ Elements of Style – MP2

§ Zombie Stress – HL2

o Conversões Totais:

§ 7th Serpent – MP2

§ Eclipse – HL2

segunda-feira, 27 de agosto de 2007

Indie Games #1 - Indie Games para n00bs

Eu escrevo uma coluna mensal para o site GameCultura(.com.br). Para aumentar a vida útil das matérias e permitir uma maior participação através de comentários, vou postá-las aqui todo mês. Os artigos serão sempre sobre jogos independentes, seja uma análise mais teórica ou uma recomendação de MODs divertidos. Eu sempre vou recomendar jogos que tem alguma ligação com o assunto do mês, mas sintam-se livre para comentar sem restrições e até mesmo recomendar outros jogos. ^^

Boa leitura...


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Falar sobre jogos independentes geralmente traz à mente o estereotipo do “alternativo”. Não é só com os jogos que isso acontece, mas também na musica. A “indie music”, mais conhecida pelo seu “indie rock”, é um desses exemplos. O indie rock é menos comum na rede popular e comercial da musica. Significa que ele seja alternativo? Não, geralmente apenas independente. É normal ver pessoas confundindo o independente com o alternativo, mas é porque um elemento leva ao outro que ocorre a confusão. O mesmo se dá com a veia independente dos filmes. Vejamos porque nessa breve introdução.

Se você é um fã de vídeo-game, há grandes chances de você ser um fã da conhecida “mainstream”. Em outras palavras, você provavelmente tem mais contato com a rede popular e comercial de jogos, que é a principal. Jogos como Sonic e Super Mario Bros, filhos respectivamente da Sega e da Nintendo, foram marcos para a história do vídeo-game. Cada um desses jogos, sem contar com as próprias séries que originaram, vendeu mais de quatro milhões de cópias e consagrou suas respectivas empresas. A lista de jogos de sucesso, das grandes empresas, não tem fim e abrange desde os clássicos (como Legend of Zelda, Myst e Starcraft) até feitos mais recentes (como Splinter Cell, The Sims, GTA e Halo). Todos esses sucessos faturando no mínimo um milhão de cópias vendidas e mostrando que os gigantes industriais sabem fazer bons jogos que nos agradam.

Em razão de todo esses sucesso é que as empresas, seja de qualquer mercado, continuam fazendo o que uma empresa sempre busca fazer: lucrar. Já os jogos independentes não precisam ser feitos por empresas. As equipes podem variar desde um único desenvolvedor até uma equipe de 10 amigos ou uma pequena empresa. As equipes não visam o lucro necessariamente (apesar de sempre ser bem-vindo), pois podem estar simplesmente atrás de uma experiência personalizada (como os MODs), ficar conhecidos ou produzir um portfolio para mais tarde serem empregados.

Por causa desse “descompromisso” com o lucro, os jogos independentes geralmente não têm recursos para serem exibidos nas prateleiras ao lado das novidades mais recentes da EA. Quando não são distribuídos de graça pela internet, são vendidos por um preço abaixo do padrão comercial e não contam com o apoio de uma grande distribuidora. Exatamente ai é que se dá o elemento chave dos jogos independentes: inovação. Porque os jogos independentes sabem que não têm como competir com os gigantes em termos de orçamento e produção (incluindo gráficos), eles seguem outras vias e geralmente atraem jogadores por seus elementos inovadores ou design criativo. Isso não significa que eles devem proporcionar uma experiência nunca vista antes porque podem também trazer de volta um estilo de jogo há muito tempo já esquecido. Seja porque alguém quer jogar uma nova versão de Pong (Plasma Pong) ou porque quer fazer coisas que o Gordon Freeman nunca conseguiria (Half Life 2 Substance).

O que muitos não percebem é a importância dos jogos independentes. Essa inovação ou liberdade de arriscar permite que muitos jogos independentes preparem terreno para futuros jogos comerciais. Um exemplo inegável é o do Counter-Strike, vulgo, CS. Inicialmente desenvolvido como um mod para o Half-Life, além de alavancar as vendas do jogo original, mais tarde foi comprado e ganhou edições comerciais. Hoje em dia o Counter-Strike é comercializado pela Valve, desenvolvedora do Half-Life, e atualmente já se encontra na sua versão “Source” (que acompanha a engine criada para o Half-Life 2). Se não fosse pelo CS, Half-Life deixaria de ter feito grande parte do sucesso que fez. Ao passo que a Valve reconheceu a importância dos jogos independentes e sabiamente aproveitou para lucrar com eles, a desenvolvedora lançou o Steam, software de distribuição digital de jogos. Hoje em dia ela distribui jogos independentes pelo mesmo software que te permite comprar uma cópia de Half-Life 2 online com apenas alguns cliques (e um número de cartão de crédito). Não é a toa que comumente podemos encontrar jogos que são comercializados com editores que permitem a modificação do jogo original.

Apesar da “cooperação” mencionada, o mais comum é vermos uma distinção bem clara da empresa grande para a independente. Do lado dos gigantes temos um recurso largamente utilizado: as seqüências. Sejam elas diretas ou “espirituais”, seqüências representam quase que lucro garantido para as grandes empresas. Seja porque pessoas querem ver o que vai acontecer com Kratos na sua segunda aventura ou porque se sentem tentados a novamente atropelar as pessoas pelas ruas de uma cidade.

A estratégia da seqüência limita de certa forma as grandes empresas ao caminho do jogo pré-establecido enquanto os independentes são associados a um caráter revolucionário. Essa associação resulta na falácia do “alternativo”. Porque geralmente temos mais contato com jogos comerciais, batizamos jogos independentes de alternativos, quando na realidade isso não é regra.

Jogos recomendados nessa matéria:

terça-feira, 24 de julho de 2007

Negra Cicatriz

Com esse post é dado início a uma novidade no Vagrant Bard. Um conto policial, de minha autoria, em seis capítulos. Porque esperar é um saco e uma tortura desnecessária, aqui vai o conto na íntegra. Leiam e divirtam-se...

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I

Uma placa azul enferrujada, daquelas pregadas em prédios, dizia o nome da rua: Avenida Imperial. O nome confirmava que eu estava no lugar certo, mas não havia avenida alguma ou qualquer coisa de imperial. A chuva descia do céu negro e abafava os ruídos de relâmpagos ao fundo. A perfeita noite para estar em casa, e ali estava eu em uma ruela mal iluminada com um esgoto congestionado descendo com dificuldade pelo canal ao lado do meio fio. O toque de atraso era evidente. Era uma rua com prédios do início do século, divididos por uma faixa estreita de paralelepípedos. Eram amarelos ou azuis, mas independente de cor estavam todos descascando e revelando o vermelho dos tijolos em diferentes pontos. Traziam-me lembranças de Sofia.

Uns dois ou três postes iluminavam de maneira precária o que ainda sobrava da rua. Entre o intervalo dos primeiros dois postes havia uma área vermelha, iluminada pelo piscar repetido de um letreiro antigo que dizia “Fun House”. O que antes devia ser uma excelente estratégia de publicidade, agora só atraia o olhar hipnotizado de um mendigo que se abrigava debaixo de uma marquise na calçada oposta. Porque a curiosidade... Não sei. Talvez ele não entendesse inglês. Talvez por isso o olhar curioso e estúpido. Não importava.

Aproximei-me do infeliz e perguntei-lhe se tinha visto alguém entrar no estabelecimento. A minha resposta foi a hipnose do letreiro decadente. Enfiei a mão no bolso e tirei um maço de cigarros. Puxei um deles pela ponta e entreguei ao mendigo. Ainda com o olhar fixo no letreiro, ele pegou o cigarro e o colocou na boca esperando o toque final. Com a outra mão, já esperando essa reação, eu tirava um isqueiro. Era um daqueles chatos de prata, típico de filmes de aventureiros. Tinha o visto pela primeira vez em um antiquário e já ia deixá-lo de lado se não fosse pela cabeça de gárgula estampada em um dos lados. Ela sim, me fez tirar a carteira do bolso. Acendi o cigarro. O homem, estupidamente, inalou e sugou com toda a força, como se aquilo fosse perfume. Até eu que não fumava sabia as conseqüências. Enquanto ele tossia, o fedor da fumaça se espalhava, assim como as respostas. Eu vi sim – ele parou para tossir – muita gente rica e arrumada. Daquelas de terno e vestidos que arrastavam no chão. Nada disso soava bem. Joguei outra migalha de nicotina ao porco e atravessei a ruela.

De baixo da marquise da casa de diversões um gigante engravatado me esperava. Não havia fila, o que era de se esperar. Já era tarde e o lugar parecia ser dos piores possíveis: um cabaré barato, sujo de pouco movimento e do pior público. Das duas uma: caminhavam em direção à falência ou lavavam dinheiro. Paletó. O provável ex-lutador de luta-livre se fez entender. Como não queria causar confusão ou sair com a cara amassada tirei o paletó molhado e o entreguei. O paletó foi revistado de maneira cuidadosa, sendo avaliado cada bolso. No último bolso foi encontrado um resto de rosa. Sem caule e amassada, mas ainda assim: uma rosa... Ou o que restava do presente de Laura. Cuidadosamente o segurança a colocou de volta no bolso e me devolveu o paletó. Pode entrar. Vire a direita. O Chefe lhe espera.


II

Entrei na casa dos prazeres e para o meu espanto, lá dentro as coisas eram bem diferentes. Fui engolido por um grande salão escuro que se apresentava com um placo no meio. Uma mulher dançava em cima enquanto fazia seu ato erótico da noite, em meio à luz negra, para os homens de meia idade com olhos arregalados.

Fiquei desnorteado. A música era a alta e o ambiente hipnotizador. Caminhei em direção ao palco para tentar descobrir onde que o tal chefe poderia estar me esperando. “Senhor... a cozinha é para o outro lado.” Foi o que uma voz disse acompanhada de uma mão que tocava o meu ombro.

Cozinha? Porque diabos eu ia querer ir para a cozinha. Suspeitei, mas ainda assim dei meia volta e identifiquei no lado oposto do salão um outro ambiente separado por uma parede de vidro. Paredes e teto acolchoados pelo mesmo couro vinho que amaciava os bancos. Uma iluminação uniforme agradável que não atrapalhava nem a garçonete que servia as bebidas ou os grupos reunidos nas mesas que podiam ver claramente suas refeições.

Empurrei a porta de vidro e notei que o som também era agradável. Ao contrário do salão negro, uma melodia mais calma tocava a fim de acalmar todos lá dentro. À minha esquerda um mosaico de garrafas era exibido atrás do balcão do bar. Não queria aparentar perdido como anteriormente, mas vasculhei as estantes alcoólicas e me deparei com a garçonete que buscava o contato visual. Ela apontou discretamente para uma porta dupla na outra ponta do salão. Janelas redondas denotavam um ar de cozinha. Minha suspeição apenas aumentava, mas correr não era uma opção. Segui calmamente e empurrei as portas, entrando no que seriam os bastidores do restaurante.

Encontrei-me dentro de um típico estabelecimento de luxo. Fogões industriais de última geração e uma bancada prata que apenas esperava pessoas para cortar e preparar os mais variados alimentos. Rapidamente um homem se aproximou de mim. Ele vestia branco e um chapéu peculiar, a típica farda de um cozinheiro.

- Prazer senhor. Eu sou o chef.

Não tive ânimo para rir.

- Me acompanhe, por favor. – disse ele diante da minha ausência de resposta.

Andamos o suficiente para eu mudar de idéia quanto ao tamanho típico da cozinha até que chegamos às escadas. Descemos dois andares até que o cozinheiro pediu que eu parasse.

Diante de nós estava mais uma porta dupla de cor prata. À esquerda dela, em cima de uma pequena bancada, uma caixa de papelão fechada.

- Vejamos... o que temos aqui... – o chefe falava enquanto abria a caixa. – Ah! Essa vai cair bem em você. – Ele retirou da caixa uma face vermelha e tribal. Parecia um demônio inca.

Peguei a máscara e experimentei no rosto. Gostei.

- Vejo que temos gostos parecidos. – o cozinheiro me bajulou como um fiel mordomo faria. – Agora, apenas gostaria de lembrá-lo que não é permitido tirar a máscara durante a festa. A menos que você esteja no banheiro individual e seja necessário. Havendo qualquer problema, procure um dos seguranças, eles estarão vestindo máscaras variadas, mas haverá sempre um girassol nos seus bolsos da frente.

Agradeci com um gesto singelo e empurrei as portas. Junto com a música e sua batida pesada veio um cheiro de carne crua. Senti-me como um predador que havia acabado de encontrar sua presa. Os fatos coincidiam e aquele era o frigorífico.

Um tapete vermelho ditava o caminho para a festa em meio ao azulejo mal iluminado. No entanto eu sabia que eventualmente teria de abandonar o vermelho do carpete para seguir o vermelho do sangue. Laura estava por aqui e seria apenas uma questão de tempo até achá-la.


III

Há coisas na vida para as quais nunca somos preparados. O frigorífico era uma delas. Em todos os meus anos de jornalista, anos de loucas festas da mais alta sociedade e “choppadas” de faculdades, eu só havia visto isso em filmes. Talvez eu não tivesse visitado os lugares “certos”. Talvez eu não tivesse um olhar tão atento assim.

Cada passo naquele carpete macio acompanhava a batida pesada eletrônica. Todo o corredor tremia ao som da música. A melodia sintetizada e os instrumentos nada naturais me agradavam e eram um alívio naquele ambiente. Techno Industrial é o que muitos falariam, mas aquela música fazia parte de um ambiente que incluía muito mais. Um ar pesado me englobava e o rastro de fumaça me indicava a origem. Um grande salão se apresentava para mim com um balcão improvisado à esquerda. A tábua, onde muitos animais provavelmente eram mortos diariamente,servia como apoio para uma exibição de drinques. Nenhum deles tinha o típico guarda-chuva decorativo, mas as cores das bebidas já eram tão fosforescentes que dispensavam qualquer adorno.

Os garçons, de terno vermelho e cabeça de demônio laranja, saiam em suas rotas pré-estabelecidas distribuindo o que pareciam ser os derivados de absinto junto com um peculiar charuto. Senti o isqueiro dentro do meu bolso, minha mão tremeu. Não era a primeira vez que eu tinha sentido a vontade de fumar. O próprio isqueiro era prova disso. Comprei-o pela face de gárgula, mas passei a carregá-lo comigo por causa da maconha. No entanto, uma viagem mal sucedida foi o suficiente para me convencer de que o isqueiro serviria apenas como uma espécie de chaveiro. Um inútil adorno do qual gostamos. As lembranças dos tempos de faculdade, embora distantes, eram o suficiente para confirmar que o cheiro do salão não era da típica erva. Quanto aos convidados, eles dançavam e riam como crianças. Crianças torpes. Não devia ser cannabis sativa, era diferente, era bom demais.

Virei à direita em uma porta estreita. Mal havia luz do outro lado, levando a entender que devia ser uma área restrita. Uma estreita escada de metal me aguardava a frente. Ao topo do primeiro intervalo de degraus encontrei um casal nu, exceto pelas máscaras, usando o chão como se fosse uma luxuosíssima cama de motel. A luxúria de uma forma geral é incontrolável, mas o azulejo gélido geralmente seria evitado por casais, mesmo com instintos sexuais aflorados. Se não fosse pelo uso óbvio de uma droga, era possível dizer que o casal estava tentando inovar uma posição sexual. Contudo, os olhos tremidos e ligeiramente tortos davam a entender que eles não tinham exata consciência do que estavam fazendo. Uma noite dessas provavelmente seria o sonho de qualquer adolescente tarado. Talvez até hoje fosse o meu.

Passei por cima do sexo dos demônios e atentei para a questão principal. Laura devia estar presa em algum lugar no segundo andar, já que este parecia ser de acesso restrito. Nunca achei que fosse me encontrar nessa situação. Procurando uma amiga minha em uma festa underground. Não é todo dia que se recebe uma ligação desesperada aos prantos de uma pessoa que mal consegue balbuciar a palavra “ajuda”. Consegui o endereço da tal Fun House e assim que vim parar aqui. Guiado pela música e uma mistura de sentimentos. Sempre tivemos uma relação de amizade saudável. Hora colorida, hora não. Assim como uma luva encaixa nas mãos, encaixou a rosa que Laura me deu de bobeira (sic) pelo dia dos namorados. Esqueci o presente no bolso como o bom cavalheiro que sou e consegui acesso à festa. Já para com Laura era o oposto. Depois da ligação eu tive certeza de que a cena estaria tatuada na minha mente. Só havia uma forma de tratar isso, salvando-a.

Entrei em uma sala mal iluminada com um labirinto formado por enormes pedaços de carne pendurados por ganchos no teto. Por sempre evitar academias nunca tive um físico hercúleo. Pelo mesmo motivo não pude me defender quando senti o minotauro me golpear na nuca.


IV

Quando consegui levantar minhas pálpebras ainda estava sem qualquer noção de localização. Tive a impressão de estar pendurado pelos meus braços e foi ao retomar os meus sentidos que percebi que estava preso. Minhas mãos começaram a doer à medida que fui sentido o metal gelado em volta delas. Deviam ser algemas que me faziam abraçar o poste atrás de mim. Ainda com a cabeça pendurada, olhando para baixo, fitei minhas pernas. Elas me sustentavam em sentido vertical, mas também estavam presas por algemas. Fiz força e lentamente consegui erguer a cabeça. Meu pescoço parecia estar levantando uma bigorna. Gemi levemente com a dor.

- Vejo que o nosso convidado de honra acordou.

Uma voz calma e ligeiramente aguda se manifestou. Meus olhos lentamente traçaram o caminho até a sua origem. Um senhor idoso, meio baixo, com uma bengala na mão sorria para mim. Ele lentamente se aproximou. Cada passo equivalente a um estalo da bengala com o chão. Ele parou a uns dois palmos da minha face e me encarou.

- Quer dizer que você é o namoradinho da ladra?

Quê? Ladra? Do que diabos ele estaria falando? Era da Laura?

- Você não sabe do que estou falando? - O velho ajeitou a sua juba grisalha com um leve movimento da mão que não segurava a bengala. – Olha, eu não gosto de jovens que mentem. Sou uma pessoa muito gentil e amável. Eu cuido bem dos meus netos. Eles gritam “vô” e pedem algo e sempre que possível eu dou. Não quero mimá-los, mas eles sabem que tudo tem um preço. Quando é hora de dormir, não há discussão. Ninguém quer relembrar o que aconteceu com o Lucas. Hoje em dia eles vão para a cama sem pestanejar. Por isso eu queria aplicar esse mesmo ensinamento a esse nosso encontro.

O pequeno senhor estalou os dedos e saiu da minha frente. No lugar dele surgiu um homem de grande porte vestindo um terno e segurando uma bola de futebol.

- Esse é o Sílvio. Ele jogava futebol profissionalmente antes de vir trabalhar para mim. – Sílvio posicionou a bola na sua frente. – Agora preste atenção filho. A minha oferta é bem simples: fale a verdade ou você pagará o preço. Assim como os meus netos pagam, a única diferença é a escala de dor. Preparado? Quanto vocês tiraram de mim?

Naquele momento eu entendi que Laura devia ter mexido com a pessoa errada. Ela nunca me falou nada e eu não tive tempo para pensar porque. A bola atingiu meu estômago antes. O ar rapidamente fugiu. Senti-me como se tivessem colocado um saco plástico na minha cabeça e dado um soco na minha barriga.

- Patético. Você parece meu neto Gilberto quando tem crise de asma. Se coloque de pé ou vai tomar outra bolada nessa posição mesmo.

- Não sei. Eu não sei de nada. – Foram as palavras que consegui balbuciar.

- Tudo bem. Vamos fazer o seguinte... – Consegui vê-lo puxando um celular do bolso do paletó – Amorzinho. Vou tentar ligar para esse tal de “amorzinho”.

Ele apertou um botão e o silêncio permeou a sala. Até mesmo a minha respiração ofegante travou. Até que o meu paletó começou a vibrar e o suor a escorrer pela minha testa. Por que a Laura salvaria meu número como “Amorzinho”? Eu nunca tinha visto isso no celular dela.

- É. Acho que você deu sorte filho. Cometemos um engano. – concluiu o velho. Ele não tinha ouvido o celular vibrando, mas na terceira vez o toque foi ativado. A pequena melodia eletrônica me lembrou uma marcha fúnebre. Tremi, quase entrando em colapso mental. Sílvio se aproximou e pegou o celular do bolso do meu paletó, agora tocando cada vez mais alto.

- Péssima escolha filho. Você mentiu para mim. Você me desrespeitou. Agora vai pagar o preço. – vociferou o chefe grisalho enquanto ele me encarava e estalava os dedos.


V

Um alto barulho crescente de metal podia ser ouvido. Sílvio abriu a porta e com a luminosidade pude identificar minha localização. Era mais um dos salões de carne do frigorífico, mas vazio. Eu estava preso a um tubo de metal que fazia parte do encanamento exposto. Um carrinho de mão, daqueles para caixotes, foi trazido e nele estava estendida Laura. O seu corpo nu amarrado ao longo da extensão vertical que acompanhava a coluna. Apenas o rosto espancado e os pés ralados podiam ser vistos enquanto todo o resto estava coberto por uma quantidade excessiva de cordas.

Ergui-me e fiquei de pé sem pensar. A dor não importou. Nossos olhares se encontraram. Enquanto os meus olhos indagavam o porquê de tudo aquilo, os dela se despediam com um singelo pedido de desculpas. As lágrimas dela interromperam o recado e estas foram interrompidas pela voz diabólica.

- Escolha uma mão. Direita ou esquerda? – disse o velho para mim enquanto ele pegava uma grande faca de açougue. – Vamos... dê a mão. Você roubou, agora vamos cortá-la. – Sílvio estava tirando minhas algemas quando foi interrompido pela voz de Laura.

- Parem! – com todos os olhares voltados para ela, continuou. – Fui eu. Eu que roubei. – lágrimas se misturavam com suas falas – Ele não sabia de nada.

Sílvio recolocou as minhas algemas e o velho se aproximou de Laura, usando a sua bengala de metal para afiar a faca.

- Temos uma heroína aqui agora. Cá estava eu achando que a minha secretária, digo ex-secretária, tinha sido manipulada pelo seu namorado. Mas não. Laura... Laura... que decepção... Eu lhe dei acesso às minhas contas e você se aproveitou da minha bondade. Você devia ter pedido demissão quando lhe dei a chance. Uma garota jovem, bonita e muito gostosa. Eu fiz o impossível e te dei uma chance. Mas agora você sabe... Ninguém sai do escritório vivo. Ninguém.

- Aquilo era dinheiro sujo! Você consegue fortunas tirando de outras pessoas. – A resposta de Laura foi uma pesada palma de uma mão na sua face.

Em seguida, ela foi desamarrada e jogada no chão. Seu corpo estava completamente marcado por cortes e manchas roxas. Sílvio e mais outro gigante de terno seguraram-na enquanto o diabo grisalho esticava o braço esquerdo. Ele sorriu para mim e levantou o facão. Laura relutava da forma que podia e respirava desesperadamente. Os gritos dela ecoaram na sala. Quando eu vi sua mão sem dedos, os meus gritos ecoaram também.

Acho que ninguém gostou da cena, nem mesmo o velho, mas ele fazia pose de quem se divertia. As falas dele começaram a ficar incompreensíveis e a minha visão escura. O branco corpo de Laura, antes escultural, agora estava em uma posição contorcida. O branco profanado, agora manchado de sangue. Meus olhos involuntariamente passaram a recusar aquelas imagens e minha visão começou a escurecer.

- Fala vadia! Cadê o meu dinheiro? Onde você colocou? Fala a conta! – gritava o chefe enquanto meu corpo deslizava. Em meio ao colapso escutei falas avulsas.

- Senhor! Ele tá apagando. – uma voz grossa se manifestou, devia ser Sílvio.

- Eu quero que ele veja isso! Bota ele pra acordar! – retrucou o velho em meio aos gritos de Laura.

Senti em algum momento uma picada no meu braço esquerdo.

Uma luz verde fez com que meus olhos abrissem. O velho e os dois gigantes estavam de pé no centro do salão. Um corvo negro voava perto do teto e deu voltas em espiral até pousar ao lado do chefe grisalho. Os quatro formavam um circulo em volta do que restava de Laura. Sua face se despedia de mim com uma lágrima congelada na bochecha. O facão de açougue deitava ao lado dos pedaços do corpo e a poça de sangue se expandia cada vez mais contaminando o que restava de alvo.


VI

* * *

- Acabou? Isso é tudo que você lembra? – me perguntou o investigador.

- É. Como te disse, perdi a consciência durante o. ato. – Ainda não era fácil para eu falar sobre aquele assunto – Por que as perguntas? Já não prenderam o assassino?

- Prenderam? Trucidaram ele. A gente sabe que o Senhor Imilel foi o responsável pela morte de Laura, mas até hoje não descobrimos quem foi responsável pela morte dele e os seus dois seguranças.

- O que importa é que ele morreu. – disse sem hesitar.

- Eu te entendo, mas precisamos descobrir isso. Pode existir algum assassino de aluguel a solta que se aproveitou da situação. Não se recorda de mais nada?

- Olha. O psiquiatra me disse que eu tenho um bloqueio de mente. Na minha opinião eu apaguei. Apaguei de nervosismo. Não desejo o que eu vi para ninguém, mas fico feliz pela morte deles. Me disseram que eu fui encontrado no chão espancado e com as algemas quebradas.

- Ao lado de três corpos trucidados. – rapidamente retrucou o investigador, como uma criança fazendo um comentário esperto em sala de aula. Ele me irritou.

- E o que você quer dizer com isso? Que fui eu? Eu matei os três?

- Não! Eu só estou tentando entender o que houve naquela noite. Eles te espancaram depois de matá-la e cortaram as algemas quando viram que estavam atrapalhando. Só pode ser isso...

- Não me importa. Eu nem sei se estar vivo é uma coisa boa e você acha que eu vou me preocupar com como eles morreram? – Eu não agüentava mais. Tive vontade de matar aquele policial com suas perguntas inconseqüentes. Um corvo desceu do teto e pousou no seu ombro. Isso me levou a outra pergunta. – Tinha algum corvo lá?

- Quê? Não, não tinha... - o investigador engoliu seco - Você tá perguntando por causa da sua visão? Aquilo foi uma alucinação da adrenalina que injetaram em você. - Agora ele se dava o luxo de recusar a informação que eu tinha lhe dado. Me cansei.

- Essa conversa não tem para onde ir. Eu vim aqui buscar os pertences da Laura. – Tinham me ligado da delegacia justamente me perguntando se eu queria buscar os objetos dela que não tinham destino. A família não era encontrada em lugar nenhum e eu era o único vínculo evidente. Obviamente ninguém do trabalho se manifestou, estava tudo um caos.

O inspetor me entregou uma caixa de papelão com várias coisas. Algumas roupas, objetos aleatórios de escritório, um ursinho de pelúcia. Um porta-retrato com uma foto dela. A saudade me impulsionou. Abri o porta-retrato e peguei a foto. Dobrei-a, guardei no bolso do casaco e sai.

Chegando em casa tirei a foto do bolso. A face de Laura permanecia alva como sempre, mas o verso da foto não. Achei uma longa seqüência de números e um nome científico marcados pela letra dela. Não foi difícil ligar os fatos. Dias depois já tinha achado o dinheiro e descoberto o que tinham injetado em mim.

A manchete “Farmacêutica Imilel envolvida em produção de drogas ilícitas” foi a minha contribuição para o fim do legado daquele velho torpe. A matéria foi lida por todos e a empresa não agüentou a pressão. Em poucos meses faliu de maneira épica.

Já a substância que foi injetada em mim era para ser o protótipo da nova sensação. Dizia-se que era para ser melhor que o ecstasy. Não foi o meu caso.

Nada me fará esquecer aquela noite. Laura. Imilel. Ou o corvo. Se há coisas na vida das quais nunca conseguiremos nos lembrar, essa é uma das que não há como esquecer. A injeção aplicada de maneira errada no meu braço marca, desde então, uma negra cicatriz que começa na minha veia e termina no meu coração.

terça-feira, 29 de maio de 2007

CARPE DIEM! VIVA OS VIDEO GAMES!

Dessa vez o post é uma exceção em termos textuais, assim como na vez do filmezinho Human há dois posts atrás. Ainda assim isso é muito importante pra mim - na esfera pessoal e profissional - como também para todos os jogares de video game por ai que apreciam uma boa trilha sonora.

Por isso..segue ai uma entrevista, publicada no GameCultura, que eu fiz com o Jack Wall a respeito do Video Games Live e o seu retorno ao Brasil. Pra quem está boiando, tem uma pequena introdução pra te situar. Qualquer coisa me perguntem. E sim, eu vou no show em setembro.

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Com o divulgado retorno do Vídeo Games Live para o Brasil não há como não se perguntar como isso tudo começou. Jack Wall e Tommy Tallarico são a resposta, afinal são os fundadores do famoso concerto que assisitmos em 2006, e em 2007 promete retornar. Wall comenta isso e mais na entrevista exclusiva.

Jack Wall é um compositor veterano da indústria de games que recentemente trouxe para o Brasil o que era antes o simples sonho de um viciado em games. Contudo o Vídeo Games Live fez com que a musica dos jogos ultrapassasse aquele simples conceito musical que só interessava aos jogadores. O show está fazendo apresentações pelo mundo afora desde 2005 e mostrando para todos que não são somente os game-maníacos que podem apreciar suas melodias favoritas, mas também aqueles que nunca botaram a mão em um controle. Em suma: O Vídeo Games Live mostrou que a musica de vídeo game em sua forma orquestrada pode agradar a todos. Jack, antes de mais nada, obrigado por essa oportunidade.

Arthur Protasio: Então, como foi o Blizzard’s Worldwide Invitational? Parece que a VGL fez sucesso na Ásia também.

Jack Wall: Foi fantástico! Que palco tivemos! Tela LED de última geração passando videos e outras três telas gigantes mostrando o evento. Muitas luzes e efeitos. A gente passou uma semana programando tudo isso antes de irmos. Foi um show muito animado. Gostei muito!

AP: Você chegou a jogar muito WOW (World of Warcraft) ou foi o trailer do Starcraft 2 que te interessou mais?

JW: Na verdade eu não cheguei a jogar nada. Eu estava muito ocupado produzindo o show com o pessoal da Blizzard e o Tommy. Ainda assim foi divertido, a gente deu umas voltas pelo evento e viu milhares de pessoas se divertindo. Inclusive assisti a um pouco do campeonato de Starcraft.

AP: É incrível ver o quanto você já alcançou. Como que tudo começou? Por que você começou a trabalhar com jogos e qual foi sem primeiro emprego na área?

JW: Ei, eu só estou interessado em musica. Eu realmente amo a carreira que eu tenho – todo dia é diferente e animado! Eu comecei em 1996 com um jogo pouco conhecido chamado Flying Saucer. Ele só foi lançado na Alemanha por uma empresa, que hoje em dia não existe mais, chamada Software2000. Era na realidade um jogo de computador bem legal e eu amei a experiência de fazê-lo. Era tão sinistro e etéreo ao mesmo tempo. A partir desse ponto eu continuei a fazer vários jogos ao lado da desenvolvedora Postlinear (inexistente arualmente) em São Franciso na Califórnia. Fiz uns bons contatos naquela empresa e depois comecei a trabalhar no Myst III: Exile e isso realmente alavancou minha carreira.

AP: Qual trilha sonora que você considera ser o seu maior sucesso e qual jogo que você mais se envolveu?

JW: Provavelmente o que eu estou fazendo agora! Eu já tenho um bom histórico: Myst III, Myst IV, Splinter Cell e Jade Empire. Agora eu estou trabalhando no Mass Effect que vai ser um grande lançamento na América do Norte no Xbox 360. Eu sei que o Xbox não é tão conhecido no Brasil, mas eu espero que alguns de vocês possam jogá-lo. É incrível! Um RPG com uma forte presença de ação que se passa no futuro – um ótimo drama de ficção científica. O jogo pretende competir diretamente com o Halo, acredito eu, mas na realidade as pessoas que jogam o um também vão jogar o outro. Então na prática não existe tanta competição.

AP: Como você surgiu com a idéia de tornar em realidade o que é hoje o show de videogames mais bem sucedido do mundo?

JW: Eu e o meu parceiro, Tommy Tallarico, nos reunimos uns 5 anos atrás e passamos a pensar em projetos que poderíamos fazer juntos. A idéia de criar um concerto rapidamente foi parar no topo da nossa lista! A gente queria trazer o mundo dos games para um cenário comum e a gente realmente tem tido um belo sucesso nisso.

AP: A versão brasileira do VGL atingiu suas expectativas?

JW: Até agora a platéia brasileira é a mais animada no mundo inteiro! Eu amei e nós estamos voltando!

AP: Com o retorno do VGL confirmado para o Brasil no mês de setembro, como que você se sente voltando?

JW: A gente ama voltar para o mesmo mercado – especialmente no Brasil! Ano passado a gente só confirmou o show no Rio poucas semanas antes de chegarmos e mesmo assim quase lotamos. Esse ano a gente espera ter os ingressos a venda bem mais cedo além de fazer vários shows!

AP: O que a platéia pode esperar? Algum repertório especial como no ano passado?

JW: A gente está planejando isso atualmente e eu realmente não quero falar nada até estarmos prontos para anunciar. A gente pode aparecer e simplesmente surpreender vocês!

AP: Você gosta de jogar videogame? Quais são os seus jogos favoritos e qual o aspecto mais importante em um jogo para você?

JW: Bem, eu tenho uma filha de 10 anos. A gente joga muito Mario e Guitar Hero juntos. Eu também gosto muito de Halo, Myst, Splinter Cell e alguns outros.

AP: Qual seu conselho para qualquer pessoa que queira seguir os seus passos?

JW: Em termos de composição, é tudo sobre a mistura de talento e os contatos que você tem na indústria. Nos Estados Unidos existe uma grande rede de contatos, especialmente na Califórnia, então se você puder ir para lá e conhecer algumas pessoas vale muito a pena. Você também pode se unir ao Game Audio Network Guild e aprender mais sobre como fazer tudo isso. Eu também recomendaria uma grande conferência que acontece todo mês de março em São Francisco, a GDC - Game Developers Conference. Em termos de apresentações e concertos... sem conselhos.

AP: Quais são seus planos futuros?

JW: Estou com projetos envolvendo composições, mas também estou planejando uma turnê européia para o VGL. Enquanto isso também estamos trabalhando aqui na Ásia. No entanto esse verão (ou inverno para os brasileiros) é tudo sobre os nove shows que apresentaremos na América do Norte e em seguida...BRASIL em setembro!

AP: Fantástico. Últimas palavras?

JW: É melhor vocês aparecerem para as nossas apresentações no Brasil!

quinta-feira, 24 de maio de 2007

A Raiz

Era uma vez

Uma terra perfeita

Mas criaram Pandora

E a paz...desfeita.


Tinha ela um pouco de cada deus

Até então nunca levado uma surra

No entanto o dia veio...

E Pandora foi burra.


Viu uma misteriosa caixa

E curiosamente a abriu

Inocentemente libertando os males

E cada um fugiu.


Todos saíram rindo e gritando

A mentira, a doença, a inveja e a velhice

Sarcasticamente caçoando:

A estúpida garota

Agora chorando


Sem solução

Os anos passando

E Pandora sem esperança,

O seu fim aguardando.


Dias últimos de sonhos belos

Como uma flor.

Dias últimos de lamentos

Repletos de dor.


Pandora faleceu

Mas as guerras continuaram.

A doença e a velhice também

As causas eram inúmeras

E o humano agora era refém


O tempo não parou

E alguns até lutaram

Enquanto outros esqueceram,

Mas nunca uma solução

Acharam


Certo dia,

O erro de sua ancestral

Decidiram reparar.

Então os descendentes de Pandora

A caixa foram procurar.


Havia uma lenda

De possível salvação

Que dentro da caixa

Estaria a solução.



Ao longo do caminho,

Foram os descendentes coletando

Um por um,

Os males capturando.


Os sacos com as presas,

Cada vez maiores

E todas as desgraças, aos poucos,

Se sentindo menores.


Mas eles,

Os males,

Não se deram por vencidos

E foi assim que iniciaram

Os seus gemidos.


Aos poucos, durante a viagem,

Semearam a discórdia

E os descendentes então indagaram:

“De quem será a glória?”


“Não há glória,

Meu caro irmão.

Acabar com essa desgraça, será a nossa recompensa,

A nossa satisfação!”


“Eu quero minha parte!

Eu tenho meu direitos!”

E os companheiros de sangue

Passaram a disputar feitos


Estabelecidos os limites para eliminação do mau

Políticas burocráticas

Regras hipócritas

Não houve uma que auxiliasse em atingir o objetivo final


As discussões continuaram

As brigas pioraram

Alguns morreram

Muitos voltaram


De muitos bem intencionados

O grupo foi reduzido a poucos

Três sobraram

Estes já roucos.


Olhavam para trás

Com tristeza reparavam

A cada cidade formada

Os males suas forças renovavam


Finalmente encontraram

A velha caixa

E quase não acreditaram

Era o fim da marcha


Colocaram os sacos com as desgraças,

Em sua prisão,

E quando se deram conta

Perceberam a ilusão


“Onde está a esperança?

Não devia estar aqui?”

“Não pode ser irmão!

Será que deixou de existir?”


Depois de conversar

E concluir a grito

Descobriram que a esperança nunca existiu

Era um mito


Anos e mais décadas passaram

Nem a fome, nem a mentira ou as guerras terminaram

“Nós, homens, é que somos maus!

Prendemos os males há anos atrás

Mas onde está o fim do caos?”


Em pacto com o que de pior poderia existir

Foi determinado pelos irmãos,

Que os males a humanidade deveria destruir


Não foi difícil

Foi inclusive breve

O mundo caminhava para seu ultimato

Como para os dentes de uma raposa, a lebre


Em tempo, todo humano foi eliminado

Restaram apenas os irmãos, agora gratos.

Se entregaram então,

Como combinado.


Depois a terra retomou a beleza que originalmente tivera

Deu início a uma nova, a melhor era.

As desgraças não quiseram essa perfeição importunar

Partiram então, para outros porcos imundos, achar.


Ficou registrado na natureza

O sacrifício de milhões

Seres que deram suas vidas

Em favor de valores mais sublimes

Seres que finalmente proporcionaram a existência

De um mundo sem crimes